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O mito da autoria científica: por que publicar 70 artigos por ano é desonestidade institucionalizada



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Ou: como a academia reproduz os mesmos mecanismos de seitas como a de Keith Raniere

Em 2020, o documentário The Vow escancarou os bastidores da seita NXIVM, liderada por Keith Raniere. Um culto que se disfarçava de programa de autoajuda, mas que manipulava, explorava e corrompia. Enquanto assistia à série, uma pergunta incômoda surgiu: em que medida o que aconteceu ali também acontece, de forma mais sutil — porém igualmente destrutiva — na academia científica?

Antes que soe como exagero, permita-me explicar.

O culto da produtividade

Keith criou um sistema onde seus seguidores eram incentivados a competir entre si por "faixas de mérito", recompensas simbólicas e a validação constante de seu “grande mestre”. Quem questionava a lógica do sistema era punido, ridicularizado ou expulso. Quem se adaptava, subia.

A academia de hoje funciona, em muitos aspectos, da mesma forma. Criou-se um ecossistema onde o valor de um pesquisador não é mais determinado por sua originalidade, profundidade ou impacto real — mas por sua capacidade de produzir em série. Publicações se tornaram moedas. A autoria, um token simbólico. E o prestígio, a nova religião.

Se Keith dava faixas coloridas, a academia dá índice h.

Cientistas que publicam um artigo a cada cinco dias

O estudo de Ioannidis et al. publicado na Nature em 2018 revelou que milhares de cientistas publicam um artigo a cada cinco dias. Isso não é um número metafórico: é estatística real. São pessoas que acumulam dezenas ou centenas de publicações por ano.

É impossível que esse ritmo seja ético. Ninguém elabora hipóteses, coleta dados, analisa resultados, redige, revisa, submete e responde pareceres a cada cinco dias — a não ser que a autoria seja uma farsa.

E é isso que temos: um sistema onde a autoria perdeu o vínculo com a contribuição intelectual e virou instrumento de vaidade institucional. Autores que nunca escreveram uma linha. Nomes colocados por política, conveniência ou hierarquia. Pós-docs coagidos a incluir o chefe. Pesquisadores obrigados a omitir quem realmente trabalhou.

Por que postdocs falsificam dados?

Fraudes científicas — que vão desde pequenos embelezamentos até dados totalmente inventados — não nascem no vácuo. Elas são frutos de ambientes disfuncionais. De sistemas que punem quem pisa no freio e recompensam quem pisa no acelerador, ainda que em direção ao abismo.

Se Keith criou um ambiente onde mulheres se automarcavam com ferro quente em nome de um ideal distorcido, a academia criou um onde pesquisadores falsificam dados, torturam gráficos e maquiam resultados para manter a ilusão de produtividade. Ambos os sistemas produzem o mesmo efeito: a destruição da integridade em nome de uma narrativa superior.

Autoria virou moeda, não responsabilidade

Segundo o ICMJE (International Committee of Medical Journal Editors), para ser autor é necessário ter contribuído substancialmente com a concepção, execução, redação e revisão do artigo. Mas quem, entre os autores prolíficos, cumpre isso? Ninguém escreve 70 artigos por ano respeitando essas diretrizes.

E no entanto, essas pessoas são promovidas. Recebem prêmios. São vistas como referência.

O sistema inteiro está invertido.

E o que isso nos diz?

O que Keith fez foi criar um ambiente de mentira com verniz de verdade. A academia, em muitos casos, faz o mesmo. Finge que está produzindo conhecimento quando, na verdade, está massificando ruído. E premiando quem domina a coreografia — não quem busca a verdade.

Precisamos parar de fingir

Não é aceitável que um cientista publique 100 artigos por ano. Não é aceitável que doutorandos sejam coagidos a adicionar nomes por hierarquia. Não é aceitável que a autoria tenha virado moeda simbólica sem vínculo com responsabilidade.

Precisamos retomar o que a ciência deveria ser: um espaço de busca honesta, de autoria responsável e de crítica mútua — não de idolatria, competição tóxica e fabricação de prestígio.

O culto à produtividade é um culto como outro qualquer: autoritário, hierárquico e cheio de dogmas.

A única diferença é que usamos jaleco no lugar de mantos.

Se quisermos salvar a ciência, precisamos primeiro admitir: o sistema está doente. E a doença começa pela autoria.




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