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Padding citation: a inflamação silenciosa da ciência


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Recentemente, tive mais uma experiência que me fez refletir sobre uma prática silenciosa — mas bastante difundida — no meio acadêmico: a citação de enchimento, também conhecida pelo termo em inglês padding citation. Trata-se de incluir referências que pouco ou nada contribuem para o argumento central de um artigo. São citações colocadas ali por protocolo, pressão editorial, ou simplesmente para parecer mais robusto.


Já fui citado por outros trabalhos e, animado, fui conferir o contexto. Em várias ocasiões, não consegui entender por que meu trabalho foi mencionado. Outros colegas também já me relataram frustração semelhante: “fui citado, mas não sei por quê.” E não é uma questão de vaidade — é um problema epistemológico. A citação, quando usada corretamente, deveria ser uma ponte entre saberes. Mas o que fazer quando ela se torna só um tijolo solto na parede?


“A ciência progride a passos lentos, mas o número de citações avança a galope.”

Na rotina acadêmica, há um fenômeno tão comum quanto subestimado: o padding citation, ou seja, o enchimento de artigos com citações pouco relevantes — e às vezes completamente desconectadas do que está sendo discutido. Trata-se de uma prática silenciosa, raramente debatida, mas que afeta diretamente a clareza, a honestidade intelectual e até a própria evolução da ciência.


O problema é estrutural — e editorial

Estou vivendo isso neste momento. O editor de um periódico me pediu para incluir mais referências na introdução de um artigo. O problema? O tema é relativamente novo: o uso de modelos de linguagem (LLMs) aplicados a contextos específicos. Antes do ChatGPT, esse subcampo praticamente não existia. É natural, portanto, que ainda não haja uma vasta literatura consolidada.


Mas, mesmo assim, recebo a exigência: “adicione mais citações.” A consequência disso é a pressão para recorrer a citações de enchimento — o que sempre evitei. Tenho verdadeiro incômodo com a prática de citar sem ter lido. Citar não deveria ser um gesto burocrático, mas um ato consciente de diálogo com o conhecimento.


Esse problema pode ser agravar em áreas novas. Ao sermos obrigados a encher o artigo de citações, mesmo quando não achamos que seria o caso, isso dilui a inovação do artigo, dando a impressão de outros já fazem o que você faz. Se olhamos na história da ciência, muitos cientistas citaram pouco: Einstein e Nash são exemplos. Para mim, o controle da citação, do que citar, deveria ser parte da autonomia do autor. Por mais bem intencionado que seja a ideia de citar extensivamente, os efeitos colaterais não valem a pena. Em nome de forçar o autor a ler, a considerar o trabalho dos outros, estamos criando uma rede de citações fazias, sem sentido prático.



A lógica do acúmulo

Você provavelmente já viu (ou fez) isso: um parágrafo introdutório que enumera sete ou oito autores, em sequência, com pouco ou nenhum esforço para explicar por que estão ali. São como fantasmas acadêmicos — aparecem, mas não interagem.

O padding citation pode ter várias causas:

  • Para parecer erudito: quanto mais citações, mais robusto parece o argumento — mesmo que seja um verniz superficial.

  • Para agradar revisores: é comum receber comentários como “faltam referências na introdução”, mesmo quando o argumento está claro e bem justificado.

  • Para alianças estratégicas: às vezes cita-se autores influentes (ou da mesma instituição) esperando reciprocidade ou boa vontade na avaliação.

  • Para inflar métricas: mais citações geram mais impacto para os citados, que também estão jogando o mesmo jogo.

Mas será que estamos escrevendo para convencer ou para inflar? A fronteira entre solidez bibliográfica e acúmulo desnecessário tem sido cada vez mais borrada.

O custo da inflação acadêmica

O padding compromete a clareza e dificulta a leitura crítica. Ao citar muitos trabalhos irrelevantes ou vagamente relacionados, o autor força o leitor a decifrar o que realmente importa. Isso pode até desincentivar a leitura cuidadosa do texto, justamente o oposto do que se espera de um artigo científico.

Além disso, cria uma falsa impressão de consenso ou validação, como se a simples repetição de nomes autorizasse um argumento. Mas ciência não é uma questão de autoridade; é de evidência, coerência e transparência.

Um ciclo vicioso?

Há quem argumente que essa prática é um sintoma e não uma causa. Os próprios revisores e periódicos muitas vezes exigem mais citações — mesmo quando não as justificam. O sistema de avaliação por métricas alimenta a lógica do acúmulo: quanto mais citado, melhor o currículo, maior a chance de fomento, mais status.

Mas a pergunta incômoda permanece: estamos escrevendo para avançar o conhecimento ou para alimentar um sistema autocentrado?

Um convite à honestidade acadêmica

Não se trata de eliminar citações — longe disso. Referenciar é reconhecer o trabalho anterior, situar-se no debate, evitar o plágio e construir em cima de ideias alheias. Mas citar com propósito é diferente de citar por hábito. A diferença está na intenção e na honestidade.

Da próxima vez que você estiver escrevendo uma introdução ou respondendo a um revisor que pede “mais referências”, experimente perguntar: essa citação realmente fortalece meu argumento? Eu a li? Entendi sua contribuição? Ou ela está aqui para inflar, preencher ou agradar?

A ciência não precisa de maquiagem. Precisa de precisão.


Será se alguém já notou isso, além de mim?


🔬 1. Padding Citation como prática estratégica

Franck, G. (1999). “Scientific Communication—A Vanity Fair?” Science, 286(5437), 53-55.

Franck descreve como o sistema de prestígio acadêmico se transformou num “mercado simbólico”, onde citações funcionam como moeda de troca. O autor aponta que pesquisadores são tentados a citar excessivamente para reforçar redes de influência e aumentar a visibilidade de certos pares ou escolas teóricas.

🔁 2. Círculos viciosos: “cartéis de citação” e manipulação de métricas

Fong, E. A., & Wilhite, A. W. (2017). “Authorship and citation manipulation in academic research.” PLOS ONE, 12(12), e0187394.

Este estudo empírico expõe práticas como a troca estratégica de citações entre autores, editores que pressionam por mais autocitações, e o uso de citações irrelevantes para inflar métricas. O artigo mostra que o problema é sistêmico e ocorre em diversas disciplinas.

📈 3. Citação como instrumento de performatividade acadêmica

MacRoberts, M. H., & MacRoberts, B. R. (2010). “Problems of citation analysis.” Scientometrics, 82(3), 349–356.

Os autores destacam que muitas citações não são indicativas de influência real. Entre os problemas descritos estão: citações de segunda mão, autocitações infladas, e citation padding. Questionam a validade de usar citações como medida de impacto intelectual.

🧠 4. Viés e irrelevância nas citações

Greenberg, S. A. (2009). “How citation distortions create unfounded authority: analysis of a citation network.” BMJ, 339, b2680.

Um estudo detalhado sobre como citações mal contextualizadas constroem falsas impressões de consenso. Greenberg demonstra que artigos mal interpretados ou irrelevantes são frequentemente usados como base para argumentos em cascata.

🏛️ 5. Pressão institucional e cultura da produtividade

Müller, R. (2014). “Racing for what? Anticipation and acceleration in the work and career practices of academic life science postdocs.” Forum: Qualitative Social Research, 15(3).

Embora o foco do artigo seja a cultura de produtividade entre pós-doutores, Müller menciona que práticas como padding surgem como consequência de pressões institucionais por publicação e visibilidade.

🧾 Conclusão

A prática de padding citation não é uma falha individual, mas um sintoma de um sistema acadêmico que valoriza quantidade sobre qualidade, visibilidade sobre precisão. O risco é duplo: empobrece o rigor científico e cria redes de autoridade baseadas em citação recíproca, não em mérito.


Como disse o físico Richard Feynman, “The first principle is that you must not fool yourself — and you are the easiest person to fool.” A honestidade científica começa na introdução — e nas citações que escolhemos incluir.


Possíveis traduções


🔹 1. Citação inchada

Prós: Transmite bem a ideia de exagero e inflamento artificial.

Contras: Pode parecer que é o conteúdo da citação que está inchado, e não o uso dela.

🔹 2. Citação inflada

Prós: Bastante próxima do original. Pode dialogar com o termo "dados inflados" ou "estatísticas infladas", já presentes no jargão.

Contras: Ainda pode ser ambígua. Pode soar como se o autor estivesse exagerando o impacto da citação, não necessariamente citando em excesso.

🔹 3. Citação pendurada

Prós: Excelente imagem visual. Remete àquela citação que aparece solta, sem explicação ou conexão com o argumento.

Contras: Traduz apenas um aspecto do padding: a desconexão contextual. Mas o termo também envolve excesso, volume, acúmulo — o "encher linguiça" acadêmico.

🔹 4. Citação ornamental ou decorativa

Prós: Indica que está ali só para enfeitar, dar aparência de erudição.

Contras: Pode suavizar demais o problema.

🔹 5. Citação de enchimento

Prós: Direta, acessível e próxima do termo original. Remete ao famoso "encheção de linguiça".

Contras: Menos elegante em contextos mais formais, mas muito eficaz para textos críticos ou blogs.

🔹 6. Citação protocolar

Prós: Sugere uma citação feita apenas para cumprir exigências (de revisores, orientadores, periódicos).

Contras: Pode não capturar o aspecto quantitativo e inflado.






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